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Artigos Meus

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22
Ago23

Lições de um «Verão Quente»

José Pacheco

 

 

A recente onda de histeria da direita mostra quão sensível ela é à quebra das alianças do Verão Quente de 75, continuadas na comunicação social que persiste em falsear a realidade, apresentando como uma ameaça à democracia os que por ela mais lutam e lutaram, antes e depois do 25 de Abril, em Portugal, na Ucrânia, na Síria ou na Venezuela.

Frank Carlucci, embaixador norte-americano em Portugal entre 1975 e 1978, «acompanhou de perto» o Verão Quente de 1975
 
Frank Carlucci, embaixador norte-americano em Portugal entre 1975 e 1978, «acompanhou de perto» o Verão Quente de 1975Créditos/ noticiasmagazine.pt

«Éque estava a ver cada vez pior, os vermelhos mais desbotados, o rosa mais amarelo e o negro a avançar!…» – dizia-me há dias um velho amigo e grande cirurgião, falando da recuperação da visão após a catarata operada, com a sua ironia política e o eterno sorriso de menino maroto.

E talvez tenha sido este Verão de tragédias e as leituras que se procuram para férias que me levaram a comprar o belo e bem documentado livro Quando Portugal ardeu, do jornalista da Visão Miguel Carvalho, uma revisitação às memórias do «Verão Quente» de 1975 e à onda de crimes da rede bombista que atacou sindicatos e partidos de esquerda, alegando querer restaurar a democracia «ameaçada pelos comunistas».

Estão lá bem documentadas as cumplicidades de insuspeitos «democratas» com a CIA de Carlucci, (condecorado por Mário Soares) e as ligações com a direita salazarenta e revanchista, onde afloram conhecidos bombistas, como Ramiro Moreira (premiado com um emprego na Petrogal e amnistiado por Mário Soares), Manuel Marques da Costa, o «Águia», Teixeira Gomes e o Ângelo «de Trancoso», industriais nortenhos como Rui Castro Lopo, Abílio de Oliveira e Joaquim Ferreira Torres, este último, silenciado a tiro por cúmplices, numa emboscada.

Estavam também envolvidos altos comandos militares, como o comandante da Região Norte, Brigadeiro Pires Veloso, chefes da PSP (Major Mota Freitas) e da PJ (Inspector Júlio Regadas), e figuras gradas da Igreja, onde se destacam o arcebispo de Braga e o Cónego Melo, este último com direito a estátua na cidade, talvez por dizer «Deus abençoe as vossas mãos» aos bombistas do MDLP (Movimento Democrático de Libertação de Portugal, de extrema-direita).

Entre muitos outros, a rede incluía membros do Conselho da Revolução, como Sanches Osório e Canto e Castro, e da Junta de Salvação Nacional, como o general Galvão de Melo e o ex-presidente da República, general Spínola, que comandou, a partir de Espanha e da Suíça, o terrorismo bombista do MDLP, e que afirmou querer «eliminar fisicamente» os comunistas a Günter Wallraff, jornalista alemão que se fez passar por traficante de armas, sendo depois premiado pelo 25 de Novembro, que o elevou a Marechal.

Agentes estrangeiros, essenciais «à festa», também não faltaram.

Para além do chefe da orquestra, o embaixador dos USA, Frank Carlucci (mais tarde chefe máximo da CIA), de Guérin-Sérac, «Morgan» (ex-OAS e director da Aginter Press fascista) e Jay Salby, o «Castor», outro importante agente da CIA, até o ex-oficial nazi Otto Skorzeny, mítico «herói» da libertação de Mussolini, entrou no conluio vendendo armas à direita fascista do ELP (Exército de Libertação de Portugal).

A esta amálgama unida no «anticomunismo» (ou no «anti-PCP»), também se juntou a esquerda dita «radical», infiltrada, como o PRP/BR, onde militava Artur Albarran (mais tarde locutor da TV e sócio de Carlucci num negócio imobiliário), ou o MRPP, de Arnaldo Matos.

«até o ex-oficial nazi Otto Skorzeny, mítico «herói» da libertação de Mussolini, entrou no conluio vendendo armas à direita fascista do ELP (Exército de Libertação de Portugal).»

 

Este último, para além de «viver à larga» – «…são como um saco para onde o dinheiro é atirado, não se sabe por quem…», no dizer de Saldanha Sanches, então seu dirigente dissidente –, trabalhava contra «os revisas do PC», colaborando na preparação do golpe de 25 de Novembro, mantendo contactos «discretos» com Soares, Eanes e Sá Carneiro, que publicamente atacavam com a senha habitual.

Essa duplicidade e ajuda à contra-revolução, foram também alegremente confirmadas pelos seus militantes de então, Ana Gomes (agora PS) e Fernando Rosas (BE), em entrevista ao programa «Baseado numa história verídica» do canal Q, de 7 de Julho de 2017.

Nesta cena de enganos, com centenas de ataques a centros de trabalho e sedes de partidos da esquerda, com mortos em carros, casas mandadas pelos ares e bombas na embaixada de Cuba que causaram duas vítimas, todos – da CIA de Carlucci às «fundações» da social-democracia europeia, dos Espírito Santo, Mello e Champalimaud aos fascistas do ELP, do MDLP, da CODECO e da Aginter Press, dos mercenários da FLNA de Holden Roberto e Chipenda aos «moderados» do PS, PSD e CDS, incluindo os «revolucionários» do MRPP e do PRP/BR – apoiaram implícita ou explicitamente a onda de terror contra sindicatos e partidos de esquerda, tendo como alvo a CGTP, MDP, UDP e PCP.

Vale a pena rever os acontecimentos desse Verão de 75, agora com mais informação e com os olhos que o tempo nos dá, para percebermos que, quando pensamos saber tudo o que o diabo amassou, descobrimos que foi ainda pior, que a violência foi mais extensa e brutal, que a mentira foi mais descarada e perversa, que a «vaga de fundo do povo português» (como dirigentes do PPD, CDS e do PS lhe chamavam) foi mais encenada e planeada, misturando política e marginalidade, anticomunismo e puro roubo, fanatismo e trafico de divisas, tudo na maior impunidade, com homens de charuto em hotéis de luxo e jantares em tascas com «mulheres e vinho», a que nem sequer faltou a exploração dos operacionais que recebiam migalhas dos muitos milhões «doados» para a «libertação de Portugal».

Ler o livro Quando Portugal ardeu, que completa outras importantes obras sobre o tema, como O 25 de Novembro a Norte – O processo Revolucionário no ano de 75, de Jorge Sarabando Moreira, levanta também a ingénua pergunta se tudo não teria sido diferente caso os intervenientes dessa conspiração contra os avanços de Abril não tivessem então escondido e negado o que hoje é, pelos próprios, afirmado sem pruridos e até com orgulho, confirmando factos e cumplicidades que, na época, pareceriam inacreditáveis ou fruto de uma doentia teoria da conspiração.

E, no entanto, houve gente com coragem que investigou tudo, descobriu tudo, que desmascarou tudo, homens honestos, como a PJ de Álvaro Guimarães Dias, Matos Fernandes, Mouro Pinto, Vaz Tomé, Lopes Duarte, o coronel Ernesto Ramos e colaboradores da PJ militar, e da SDCI, a informação militar, do Capitão de Mar e Guerra Rodrigues Soares e camaradas, estes últimos presos logo a 26 de Novembro.

«Apesar do significado intrinsecamente antidemocrático da onda terrorista, para alguns dos testemunhos do "centro" e da "esquerda moderada", tudo se passou como se essa conjura constituísse apenas uma fase sombria mas incontornável da nossa democracia»

 

Gente impoluta que correu enormes riscos, enfrentando ameaças vindas de fora e das próprias instituições a que pertenciam, a que o País nunca agradeceu devidamente.

Apesar do significado intrinsecamente antidemocrático da onda terrorista, para alguns dos testemunhos do «centro» e da «esquerda moderada», tudo se passou como se essa conjura constituísse apenas uma fase sombria mas incontornável da nossa democracia e, por isso, ética e politicamente aceitável.

Nesta encenação, entra também o «cerco» ao 1.º Congresso do CDS no Porto, invocado símbolo da vocação ditatorial dos «comunas», acontecimento organizado e convocado por militantes de todas as origens (Juventude Socialista, LCI, LUAR, PRP-BR, OCMLP…), menos pelo PCP (!), que, em comunicados e nas palavras de Álvaro Cunhal, «não organizou, não participou e não apoiou as manifestações» contra o congresso do CDS.

Apesar disso, para os media nacionais e internacionais, o badalado «cerco» passou a ser a prova incontestável da falta de sentido democrático do PCP, (o Daily Telegraph dizia que «reflectia uma técnica comunista clássica»), assumindo ainda hoje, a direita, o papel de virginal vítima, enquanto, por trás do pano, organizava a onda de incêndios, atentados à bomba e fuga de capitais que preparou o 25 de Novembro.

Chegou-se até a querer «dividir» o país com uma zona «livre», a norte de Rio Maior, terra das célebres mocas (símbolo da sua «democracia»…), com o governo de Mário Soares a ameaçar «fugir» para o Porto, onde ficaria protegido «dos vermelhos» pelo ELP e pelo MDLP de Alpoim Galvão e Spínola, com a bênção do Cónego Melo.

António Taborda, prestigiado advogado e um dos defensores das vítimas da rede bombista, mais de 40 anos depois, ouvido por Miguel Carvalho, concluiu:

«Para mim, estava tudo harmonizado entre o embaixador norte-americano Frank Carlucci, o Mário Soares, o MDLP, o ELP e a arquidiocese de Braga».

Como dizia Ramiro Moreira, o bombista-mor: «Era tudo anticomunismo! Era uma festa!».

Talvez essa experiência nos permita perceber melhor como se organizam e desenvolvem «revoltas» como a da Praça Maidan, na Ucrânia, ou os boicotes e as violentas manifestações anti-governamentais na Venezuela.

Em Portugal, a «guetização» do PCP e da esquerda à esquerda do PS, mantida desde o 25 de Novembro de 75, só nas últimas eleições foi em parte quebrada com a inflexão do PS, forçado a abrir a negociação das condições mínimas para a viabilização parlamentar de um governo socialista, na sequência do repúdio eleitoral da política dos governos da troika.

O fim do sequestro da democracia pelo chamado «arco do poder» do PS, PSD e CDS representou, por isso, uma derrota maior dos que acobertam a defesa dos interesses do grande capital com a instrumentalização de mentiras e preconceitos anticomunistas.

A recente onda de histeria da direita (ver artigo de João Miguel Tavares «Somos todos demasiado tolerantes com o PC» – Público, 8/7/17) e a desesperada invenção do «diabo» que faltava, chegado numa manhã de fumo ou de nevoeiro com a exploração ad nauseam da tragédia de Pedrógão (cavalgando as dificuldades criadas pela sua própria política de privatização e desinvestimento nos serviços públicos), mostram, para além de enorme hipocrisia, quão sensível ela é à quebra das alianças do Verão Quente de 75, continuadas na comunicação social que persiste em falsear a realidade, apresentando como uma ameaça à democracia os que por ela mais lutam e lutaram, antes e depois do 25 de Abril, em Portugal, na Ucrânia, na Síria ou na Venezuela.

Também por isso, é difícil compreender os que, afirmando-se críticos da política agressiva e de pilhagem neocolonial da União Europeia e dos USA no Médio Oriente ou na América Latina, cedem à pressão da contra-informação da direita dando crédito à velha receita dos «Verões quentes» da CIA, pondo-se ao lado dos Spínolas e Cónegos Melo locais e das orquestradas campanhas contra governos eleitos que procuram defender as populações dos seus desígnios de rapina.

20
Out22

China: Xi se prepara para a contagem regressiva final

José Pacheco

por Pepe Escobar

O discurso de 1h45min do presidente Xi Jinping na abertura do 20º Congresso do Partido Comunista da China (PCC) no Grande Salão do Povo em Pequim foi um exercício absorvente do passado recente informando o futuro próximo. Toda a Ásia e todo o Sul Global deveriam examiná-lo cuidadosamente.

O Grande Salão foi ricamente adornado com brilhantes estandartes vermelhos. Um slogan gigante pendurado no fundo do salão dizia: “Viva nossa grande, gloriosa e correta festa”.

Outro, abaixo, funcionou como um resumo de todo o relatório:

“Segure erguida a grande bandeira do socialismo com características chinesas, implemente plenamente o  pensamento de Xi Jinping sobre o socialismo com características chinesas para uma nova era , leve adiante o grande espírito fundador do partido e se unam e lutem para construir plenamente um país socialista moderno e para promover plenamente o grande rejuvenescimento da nação chinesa”.

Fiel à tradição, o relatório delineou as conquistas do PCC nos últimos 5 anos e a estratégia da China para os próximos 5 – e além. Xi prevê “tempestades ferozes” à frente, domésticas e estrangeiras. O relatório foi igualmente significativo para o que não foi explicitado, ou deixado sutilmente implícito.

Todos os membros do Comitê Central do PCCh já foram informados  sobre o relatório – e o aprovaram. Eles passarão esta semana em Pequim estudando as letras miúdas e votarão para adotá-las no sábado. Em seguida, um novo Comitê Central do PCC será anunciado e um novo Comitê Permanente do Politburo – os 7 que realmente governam – será formalmente endossado.

Essa nova formação de liderança esclarecerá os rostos da nova geração que trabalharão muito perto de Xi, bem como quem sucederá Li Keqiang como o novo primeiro-ministro: ele terminou seus dois mandatos e, de acordo com a constituição, deve renunciar baixa.

Há também 2.296 delegados presentes no Grande Salão representando os mais de 96 milhões de membros do PCC. Eles não são meros espectadores: no plenário que terminou na semana passada, eles analisaram com profundidade todos os grandes temas e se prepararam para o Congresso Nacional. Eles votam nas resoluções do partido – mesmo quando essas resoluções são decididas pela liderança de topo, e a portas fechadas .

As principais dicas

Xi afirma que nos últimos 5 anos o PCCh avançou estrategicamente na China enquanto “corretamente” (terminologia do Partido) responde a todos os desafios estrangeiros. As conquistas particularmente importantes incluem o alívio da pobreza, a normalização de Hong Kong e o progresso na diplomacia e na defesa nacional.

É bastante revelador que o ministro das Relações Exteriores Wang Yi, que estava sentado na segunda fila, atrás dos atuais membros do Comitê Permanente, nunca tirou os olhos de Xi, enquanto outros liam uma cópia do relatório em suas mesas.

Comparado às conquistas, o sucesso da política Zero-Covid ordenada por Xi permanece altamente discutível. Xi enfatizou que protegeu a vida das pessoas. O que ele não poderia dizer é que a premissa de sua política é tratar o Covid e suas variantes como uma arma biológica dos EUA direcionada contra a China. Ou seja, uma questão séria de segurança nacional que supera qualquer outra consideração, até mesmo a economia chinesa.

O Zero-Covid atingiu fortemente a produção e o mercado de trabalho e praticamente isolou a China do mundo exterior. Apenas um exemplo flagrante: os governos distritais de Xangai ainda estão planejando o Covid-zero em uma escala de tempo de dois anos. Zero-Covid não vai desaparecer tão cedo.

Uma consequência grave é que a economia chinesa certamente crescerá este ano menos de 3% – bem abaixo da meta oficial de “cerca de 5,5%”.

Agora vamos ver alguns dos destaques do relatório Xi.

Taiwan: Pequim iniciou “uma grande luta contra o separatismo e a interferência estrangeira” em Taiwan.

Hong Kong: Agora é “administrado por patriotas, tornando-o um lugar melhor”. Em Hong Kong houve “uma grande transição do caos para a ordem”. Correto: a revolução colorida de 2019 quase destruiu um grande centro comercial/financeiro global.

Alívio da pobreza: Xi o saudou como um dos três “grandes eventos” da década passada, juntamente com o centenário do PCC e o socialismo com características chinesas entrando em uma “nova era”. O alívio da pobreza é o cerne de um dos “dois objetivos centenários” do PCC.

Abertura: a China se tornou “um importante parceiro comercial e um importante destino para investimentos estrangeiros”. Isso é Xi refutando a noção de que a China se tornou mais autárquica. A China não se envolverá em nenhum tipo de “expansionismo” enquanto se abre para o mundo exterior. A política básica do Estado permanece: a globalização econômica. Mas – não disse – “com características chinesas”.

“Auto-revolução”: Xi introduziu um novo conceito. A “auto-revolução” permitirá à China escapar de um ciclo histórico que leva a uma desaceleração. E “isso garante que a festa nunca mudará”. Então é o CPC ou busto.

Marxismo: definitivamente permanece como um dos princípios orientadores fundamentais. Xi enfatizou: “Devemos o sucesso de nosso partido e socialismo com características chinesas ao marxismo e como a China conseguiu adaptá-lo”.

Riscos: esse foi o tema recorrente do discurso. Os riscos continuarão interferindo nesses “dois objetivos centenários” cruciais. A meta número um foi alcançada no ano passado, no centenário do PCCh , quando a China alcançou o status de “sociedade moderadamente próspera” em todos os aspectos ( xiaokang , em chinês). O objetivo número dois deve ser alcançado no centenário da República Popular da China em 2049: “construir um país socialista moderno que seja próspero, forte, democrático, culturalmente avançado e harmonioso”.

Desenvolvimento: o foco será no “desenvolvimento de alta qualidade”, incluindo a resiliência das cadeias de suprimentos e a estratégia econômica de “dupla circulação”: expansão da demanda doméstica em paralelo ao investimento estrangeiro (principalmente centrado em projetos do BRI). Essa será a principal prioridade da China. Assim, em teoria, quaisquer reformas irão privilegiar uma combinação de “economia de mercado socialista” e abertura de alto nível, misturando a criação de mais demanda doméstica com reforma estrutural do lado da oferta. Tradução: “Dual-circulação” em esteróides.

“Democracia de todo o processo”: esse foi o outro novo conceito introduzido por Xi. Traduz como “democracia que funciona”, como no rejuvenescimento da nação chinesa sob – o que mais – a liderança absoluta do PCC: “Precisamos garantir que as pessoas possam exercer seus poderes através do sistema do Congresso Popular”.

Cultura socialista: Xi disse que é absolutamente essencial “influenciar os jovens”. O PCCh deve exercer o controle ideológico e garantir que a mídia fomente uma geração de jovens “influenciados pela cultura tradicional, patriotismo e socialismo”, beneficiando assim a “estabilidade social”. A “história da China” deve ir a todos os lugares, apresentando uma China “credível e respeitável”. Isso certamente se aplica à diplomacia chinesa, até mesmo aos “Guerreiros Lobos”.

“Religião Sinicise”: Pequim continuará sua campanha para “Religião Sinicize”, como na adaptação “proativa” da “religião e da sociedade socialista”. Esta campanha foi introduzida em 2015, o que significa, por exemplo, que o islamismo e o cristianismo devem estar sob o controle do PCC e alinhados com a cultura chinesa.

A promessa de Taiwan

Agora chegamos aos temas que obsediam completamente o decadente Hegemon: a conexão entre os interesses nacionais da China e como eles afetam o papel do Estado-civilização nas relações internacionais.

Segurança nacional: “A segurança nacional é a base do rejuvenescimento nacional, e a estabilidade social é um pré-requisito da força nacional”.

Os militares: o equipamento, a tecnologia e a capacidade estratégica do PLA serão fortalecidos. Escusado será dizer que isso significa controle total do PCC sobre os militares.

“Um país, dois sistemas”: provou ser “o melhor mecanismo institucional para Hong Kong e Macau e deve ser respeitado a longo prazo”. Ambos “gozam de alta autonomia” e são “administrados por patriotas”. Xi prometeu integrar melhor ambos nas estratégias nacionais.

Reunificação de Taiwan: Xi fez uma promessa de completar a reunificação da China. Tradução: devolver Taiwan à pátria. Isso foi recebido com uma torrente de aplausos, levando à mensagem principal, dirigida simultaneamente à nação chinesa e às forças de “interferência estrangeira”: “Não renunciaremos ao uso da força e tomaremos todas as medidas necessárias para impedir todos os movimentos separatistas”. Conclusão: “A resolução da questão de Taiwan é uma questão para o próprio povo chinês, a ser decidida pelo povo chinês”.

Também é bastante revelador que Xi nem sequer mencionou Xinjiang pelo nome: apenas por implicação, quando enfatizou que a China deve fortalecer a unidade de todos os grupos étnicos. Xinjiang para Xi e a liderança significam a industrialização do Extremo Oeste e um nó crucial na BRI: não o objeto de uma campanha imperial de demonização. Eles sabem que as táticas de desestabilização da CIA usadas no Tibete por décadas não funcionaram em Xinjiang.

Abrigo da tempestade

Agora vamos descompactar algumas das variáveis ​​que afetam os próximos anos muito difíceis para o CPC.

Quando Xi mencionou “fortes tempestades à frente”, é isso que ele pensa sobre 24/7: Xi está convencido de que a URSS entrou em colapso porque o Hegemon fez tudo para miná-la. Ele não permitirá que um processo semelhante atrapalhe a China.

No curto prazo, a “tempestade” pode se referir à última rodada da guerra americana sem restrições contra a tecnologia chinesa – para não mencionar o livre comércio: impedir a China de comprar ou fabricar chips e componentes para supercomputadores.

É justo considerar que Pequim mantém o foco no longo prazo, apostando que a maior parte do mundo, especialmente o Sul Global, se afastará da cadeia de suprimentos de alta tecnologia dos EUA e preferirá o mercado chinês. À medida que os chineses se tornam cada vez mais autossuficientes, as empresas de tecnologia dos EUA acabarão perdendo mercados mundiais, economias de escala e competitividade.

Xi também não mencionou os EUA pelo nome. Todos na liderança – especialmente o novo Politburo – estão cientes de como Washington quer

“desacoplar” da China de todas as maneiras possíveis e continuará a implantar provocativamente todas as vertentes possíveis da guerra híbrida.

Xi não entrou em detalhes durante seu discurso, mas está claro que a força motriz daqui para frente será a inovação tecnológica ligada a uma visão global. É aí que entra o BRI, novamente – como o campo de aplicação privilegiado para esses avanços tecnológicos.

Só assim podemos entender como Zhu Guangyao, ex-vice-ministro das Finanças, pode ter certeza de que o PIB per capita da China em 2035 pelo menos dobrará os números de 2019 e chegará a US$ 20.000.

O desafio para Xi e o novo Politburo imediatamente é corrigir o desequilíbrio econômico estrutural da China. E aumentar novamente o “investimento” financiado por dívida não funcionará.

Portanto, pode-se apostar que o terceiro mandato de Xi – a ser confirmado ainda esta semana – terá que se concentrar em rigoroso planejamento e monitoramento da implementação, muito mais do que durante seus anos anteriores ousados, ambiciosos, abrasivos, mas às vezes desconectados. O Politburo terá que prestar muito mais atenção às considerações técnicas. Xi terá que delegar autonomia política mais séria a um bando de tecnocratas competentes.

Caso contrário, voltaremos à observação surpreendente do então primeiro-ministro Wen Jiabao em 2007: a economia da China é “instável, desequilibrada, descoordenada e, em última análise, insustentável”. É exatamente onde o Hegemon quer que seja.

Do jeito que está, as coisas estão longe de serem sombrias. A Comissão Nacional de Desenvolvimento e Reforma afirma que, em comparação com o resto do mundo, a inflação ao consumidor da China é apenas “marginal”; o mercado de trabalho é estável; e os pagamentos internacionais são estáveis.

O relatório de trabalho e as promessas de Xi também podem ser vistos como uma reviravolta nos habituais suspeitos geopolíticos anglo-americanos – Mackinder, Mahan, Spykman, Brzezinski – de cabeça para baixo.

A parceria estratégica China-Rússia não tem tempo a perder com jogos hegemônicos globais; o que os motiva é que, mais cedo ou mais tarde, eles estarão governando o Heartland – a ilha do mundo – e além, com aliados do Rimland e da África à América Latina, todos participando de uma nova forma de globalização. Certamente com características chinesas; mas acima de tudo, características pan-eurasianas. A contagem regressiva final já começou.

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